domingo, 29 de dezembro de 2013

roteiro natalício para otários: Check

Fomos um bocadinho antes da uma da tarde, pois sabíamos que à hora da sagrada refeição ninguém penetraria no interior da tão falada Aldeia de Natal, em Lisboa.
Pagámos a bagatela de 40 euros/bilhete de família e lá transpusemos a entrada, esperando encontrar a sétima maravilha natalícia, pois por aquele preço, não poderíamos esperar menos do que neve nos cornos, um Pai Natal a cada esquina, vinho aquecido com canela, transporte em trenós puxados por renas, enfim, a Lapónia no Marquês de Pombal. Mas nada disso, ali estavam, de facto, 3 jovens renas, às quais apenas se tinha acesso pagando uma fotografia ao lado de anões rodeados de lama. Estava também uma coruja das neves, acorrentada e umas árvores salpicadas de branco e rodeadas de lama.
Subimos um pouco, em busca do presépio humano, apenas para descobrir que S. José, Nossa Senhora e o menino tinham ido à bucha, pois só estava o burro perto da manjedoura e na tenda dos reis magos, apenas um rei dormitava perto dos três camelos (o ponto alto da visita).
Cinquenta por cento da Aldeia de Natal é composta por cabaninhas para a bucha e respectivas mesas de apoio, com leitão, caldo verde, pão com chouriço e brigadeiros.
Havia uma espécie de globo de plástico, onde se fazia fila para os putos penetrarem e receberem com esferovite, ou espuma na carola, simulando neve nórdica e mais uma fila para, pasme-se com a originalidade, pinturas faciais.
Facto 1 e, no fundo, o mais importante: Os miúdos gostaram. Afinal de contas, ainda estão na maravilhosa idade de encontrarem encantamento em tudo.
Facto 2: À organização desta merda mal amanhada: VÃO ROUBAR PARA A ESTRADA.

sábado, 28 de dezembro de 2013

superar obstáculos

Nem todos temos que ser heróis e superar obstáculos de forma irrepreensível, até porque o tamanho dos obstáculos varia consoante os olhos que os enfrentam. É precisamente como a tolerância à dor, que varia de pessoa para pessoa.
Essa treta de enchermos o peito a desafios que nos tolhem é precisamente isso, treta. Resulta para uns, não tem que resultar para outros.
Muitas vezes é de peito para dentro e estômago colado ao coração que avançamos, a medo, inseguros, mas ainda assim ousamos dar o primeiro passo, mesmo sabendo que poderemos estacar ali adiante, envoltos na névoa da falta de forças e de protagonismo na nossa própria vida, envoltos na dúvida de que somos realmente capazes de fazer diferente.
E isso não é necessariamente bom, nem mau. É apenas.
Para esses, cada pequeno passo que não volta para trás é uma imensa vitória, mas não é um salvo conduto para que tudo continue a correr bem. Há que firmar bem os pés a cada passo alcançado.
Admitirmos que somos frágeis é abrirmos a porta a caminhos diferentes daqueles que trilham os que derrubam tudo à sua frente e assumirmos que nem todos temos que ser super heróis, mas que nem por isso, deixaremos de ter as nossas pequenas grandes vitórias.

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Professores

Eu já sabia que os nossos cursos eram merdosos, mas constato, da pior forma possível, que é o próprio governo que não acredita neles, pois entende não serem suficientes para atestarem a capacidade dos professores leccionarem.
Deviam inventar assim uma espécie de exame da Ordem dos Advogados para o resto de todas as profissões. Vamos lá arranjar mais um patamarzinho para escalar e para verificar que não andaram todos a tirar cursos à Relvas.
Eu já sabia que trabalhar para o Estado, no nosso país, é exercício estoico e masoquista, que só aguenta quem tem rendas e empréstimos para pagar e filhos para sustentar, mas ultimamente sei-o com mais segurança do que nunca e maça-me ver aqueles que ajudam a educar os meus filhos, aqueles em quem confio para lhes ensinarem as coisas que não consigo ensinar-lhes, sujeitos a tanta merda.
Maça-me e sinto-me um bocadinho envergonhada.

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

PUB

Num país de sacro santos jornalistas, em que os Deuses do Jornalismo caem em cima de Rodrigo Guedes de Carvalho, por ter conduzido uma entrevista fictícia de humor, ninguém fala sobre os profissionais da área, que utilizam blogues pessoais para, de forma encapotada e manhosa, fazerem publicidade a produtos?
"Hoje, acidentalmente e de forma totalmente aleatória, tropecei numa lata de Sagres, que caiu, acidentalmente e de forma totalmente aleatória, de uma varanda e, como não tinha mais nenhuma bebida refrescante ao meu alcance, abri a lata e, só por acaso, experimentei. Soube-me tão bem e dizem que tem propriedades medicinais. Dizem, que eu cá não digo nada".
Façam lá a publicidade toda que quiserem, pois que eu também me venderia por um carrinho de compras no supermercado (e continuo a achar que sou subvalorizada em termos de propostas publicitárias, olá, olá, estou aqui!).
Só não façam as pessoas de estúpidas, combinado?

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Mudar o Foco

Sempre invejei as pessoas que conseguem conduzir com penduricalhos no retrovisor, sejam eles árvores de cheiro, mulheres semi-nuas, ursinhos de peluche, flores, bandeirolas de um clube de futebol. Como conseguem eles conduzir sem estar permanentemente a olhar para aquele objecto saltitante, mesmo em frente dos seus olhos? Como conseguem abstrair-se daquela coisa que se agiganta e salta, sem desviarem o foco da estrada?
Isto vale para o resto das coisas na minha vida, pois é como se tivesse um auto-focus a funcionar na minha cabeça, uma espécie de programador automático que não me deixa apreciar as pequenas coisas, quando objectos maiores se atravessarem à minha frente.
Será que preciso de meditação, de yoga zen, ou yang? Será que preciso de rever os meus olhos-pós-operação-miopia, a fim de deixar de ser míope para as coisas do espírito?
Gostava de levar a cabo todos aqueles bonitos dizeres que nos mandam dançar à chuva em dias de chuva, pegar nos calhaus do caminho e construir castelos, juro que sim, pois ainda vejo a chuva como uma coisa desconfortável que me molha e me acinzenta e os calhaus, bem, acho que os calhaus, para mim, serão sempre calhaus.

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

natal

O rosto corado pelo cansaço debruça-se sobre a mesa enfeitada de cores de verde e encarnado. Acende as últimas velas e dos lábios brotam suspiros de dor, pois o vigor da juventude há muito abandonou os músculos que lhe comportam os passos.
As crianças gritam, pedindo os presentes e temendo aquele homem barbudo e de pança pronunciada que se reveza com o menino jesus da sua meninice.
Não lhe acha mal, ao Pai Natal, nem ao rebuliço barulhento dos netos. Não encontra mal no cansaço e nos afazeres que lhe enchem a casa de vida, pois sabe que os anos diante de si são apenas uma questão de poucos dias.
Não encontra angústia no excesso de mimo, do qual os meninos parecem sempre cobertos nesta época, pois sabe que não há nada como o mimo bem doseado nas alturas em que é suposto o amor aparecer em excesso.
Lembra a vizinha do outro lado da rua e coloca o xaile sobre os ombros. Irá lá levar-lhe uma mão cheia de rabanadas e sonhos. Não dos sonhos que se sonham, mas daqueles que adoçam a ponta da língua. Ela não quer vir para a sua casa, não lhe diz nada já o Natal. Faz questão de não o celebrar, mas todos sabem que o chora com o fervor dos que acreditam nele e o perderam.
Regressa para casa e abraça os netos, um por um, prometendo-lhes o mundo inteiro de mimo perto da chaminé e sabendo que o Natal será sempre assim, em função dos outros, pois é nessa função que se encontra e que concilia aquilo que lhe é importante.