Apertado numa caixa que o protege, ele bate e movimenta-se, bombeando o sangue para dentro e para o resto do meu corpo, mas na realidade o meu coração está a alguns quilómetros de distância, mais precisamente dentro de uma sala de aula, na escola do António.
Pensei que tudo fosse ser razoavelmente fácil e sem grandes percalços, pois o meu filho nunca foi especialmente preso a mim e sempre gostou de se aventurar no parque, de galhofar com os primos, de correr como um doido e dizer que sim a qualquer aventura, por isso, quando no primeiro dia de escola ele ficou a dizer-me adeus com um sorriso, confirmei que tudo decorreria sem grandes angústias e o meu coração, apesar de mais pequeno, bateu com força pelo coração pequeno e independente dele.
Passaram alguns dias, uma virose e outra constipação depois, passaram alguns dias, poucos, e ele começou a perceber que a escola fazia efectivamente parte das "obrigações". Passaram alguns dias, muito poucos mesmo, e o António começou a acordar de madrugada, a dizer-me que não quer ir à escola, anda pela casa angustiado e sem sorriso a perguntar-me se tem que ir à escola.
Ao jantar é essa a preocupação dele, de madrugada é essa a preocupação dele, de tarde, quando chega a casa, é essa a preocupação dele.
Diz-me que gosta tanto da casa dele, que gosta mais da minha comida, que me quer muito e eu demoro sempre tanto a ir busca-lo (é o primeiro a sair). Confirma comigo cerca de 200 vezes por minuto, se vou mesmo busca-lo e eu digo-lhe que ninguém fica na escola, que irei sempre, mas sempre busca-lo. Volta a perguntar-me passados dois minutos, apenas para me confirmar na sua vida, para ficar seguro de que o amo e de que a sua realidade é também, e ainda, a nossa antiga realidade. Chora em casa e pergunta-me porque tem que ir, porque é que não pode ficar e eu deixo-me lá ficar perto dele, deixo o meu pensamento, o meu coração e umbom bocado do meu corpo bem perto e sinto-me sem coração o dia inteiro.
Depois tenho que pôr a minha cara cómica e escrever coisas ligeiras, passar para uma cara mais séria, enquanto escrevo coisas mais sérias, até chegar a hora em que ponho a cara serena para ir busca-lo e para continuar a confirmar-lhe que estou aqui e que o amo tanto, ou ainda mais do que sempre.
Não é fácil ter que pôr tantas caras e já estou perdida há muito tempo nesta confusão que é ter que fingir que tudo está bem, quando me sinto sem coração.
Dizem que é tudo natural, que é a adaptação dele a uma nova realidade e o deixar para trás a realidade que lhe é conhecida, mas eu não quero saber das coisas naturais que fazem sofrer o meu bebé, eu quero apenas que ele sorria e que o meu coração volte ao meu corpo.