sexta-feira, 17 de abril de 2015

Agarrados

Sei que dizem que procuramos apenas aquilo que nos importa, mas não é bem assim. Quantas vezes procuro coisas que não me importam a ponta de um corno, cedendo apenas àquele instinto pateta de satisfazer o meu lado voyeurista e viciado em vazio?
"Se gostasses não ias ver" é uma frase que todos sabemos impossível. Em certos dias cedo ao cansaço e, sem forças para coisas profundas, percorro Instagrams, facebooks de figuras públicas e não só e fico ali literalmente a entrar na vida dos outros, que abrem as portas das suas vidas, sem qualquer espécie de pudor. E acabo sempre por concluir, salvo raras excepções, que as pessoas padecem de forma severa e nauseante do vício da partilha. Estão completamente agarradas, parecendo sofrer de uma espécie de psicose, provavelmente nomeada já por especialistas, psicose essa que os impele a partilharem em modo compulsivo. É o vício da década. Não é droga, não é bebida, nem tabaco, mas apodrece a vida de uma forma corrosiva, porque já não sabem estar numa esplanada, numa viagem, numa praia a sós, na cama, caraças! Já não sabem estar bem, ponto final. É como se, pelo facto de não partilharem não estivessem a viver aquele momento e isso é claustrofóbico a um ponto que não consigo descrever.
Estas pessoas que padecem deste ET que lhes aterrou no cérebro e o mirrou em certos pontos, não deixam nunca de parar em frente a cada espelho e partilhar a sua própria imagem, tirar fotos a si próprios a malhar, a correr, a comer, a defecar, a pintar paredes, unhas, no corredor do supermercado a comprar feijoada enlatada, partilhar escritos, mofo no canto do tecto, idas à casa de banho, ao parque, passeios de carro, na praia, no campo, no shopping, nos elevadores, nos espelhos, muitos, muitos espelhos e, basicamente na puta que os pariu, partilhando cada, mas cada segundo da sua existência que precisa da confirmação da partilha a fim de o cérebro poder processar que passou por ali.
A sério, sei que devo ao mundo todas as doses de tolerância com que o mundo me brinda a mim e às minhas neuroses e taras, sei que devo ao mundo e às pessoas, doses equilibradas de tolerância e compreensão, mas este fenómeno, caraças, deprime-me à brava e não vejo fim à vista. O que é demais enjoa.
Será que chegou a nós uma nuance nova da palavra solidão? Sentir-se-ão estas pessoas estupidamente sós se não se partilharem nestes moldes?
Acordem. Há vida além dos espelhos, eu garanto-vos. O que procuram, o que buscam nas selfies, o que pensam receber com tanto que expõem?
Sim, Ana C. tolera, deixa de ser idiota, até porque já sabes que vai haver cerca de 120 pessoas que pensam que estás a falar delas, mas não, falo do mundo em que vivemos hoje em dia. É urgente acordarmos. Eu que vou ver as 1234 selfies que alguém tirou durante o dia e quem tira 1234 selfies durante o dia.

segunda-feira, 13 de abril de 2015

pessoas chatas

Depois de percorrer cerca de dez meias maratonas em torno da minha própria cabeça, concluo que não existem pessoas mais estranhas do que aquelas que não sabem rir e concluo também (ó mente cansada a minha que nada mais conclui nem imagina) que não existe situação mais estranha do que aquela em que dizemos uma piada, iniciamos aquele risinho estúpido e meio histérico e a pessoa à nossa frente nos encara com o olhar mais sério e mais chato do mundo. Depois o nosso risinho vai parando, parando até não restar mais nada do que o silêncio enfadonho de quem não ri connosco.
E assim divido o meu mundo entre as pessoas que percebem uma piada, por mais cretina que seja, e aquelas que se ofendem com a piada, ou pior, mil vezes pior, não a atingem.