quinta-feira, 6 de junho de 2013

parece que hoje farias 31 anos,

mas parece também que teremos que deixar de contar os teus aniversários, como parte disto de nos teres morrido.
A tua mãe lembra-te desde o dia em que te viu pela primeira vez e recorda cada um dos 6 de Junho desde então, com uma precisão dolorosa. Foste o seu bebé, a sua menina, a sua mulherzinha independente e ela teve que deixar-te partir em cada uma dessas pequenas mortes, para que pudesses crescer.
Mas ter que deixar-te crescer assim tanto, para longe do mundo que conhecemos. Ter que deixar-te partir definitivamente, nenhuma mãe sabe como fazê-lo. É um percurso infinito e a cada 6 de Junho que passar, recordará tudo de novo e o caminho parecerá tornar-se de novo infindo.
O teu pai recorda a sua eterna menina, que o será sempre e ainda não acredita que tem que deixar-te passar, a ti e aos 6 de Junho, sem que tenhas passado de verdade.
A tua irmã mais nova recorda os 6 de Junho desde que se lembra de recordar-te a ti e com eles chegam as memórias infinitas de vocês, de como tudo era desde sempre.
Os teus amigos lembram, com aquele nó apertado e fundo que nos corta a respiração, as festas, os jantares, as conversas, os copos, a cumplicidade, o riso e as lágrimas e sabem que serás recordada em todos os 6 de Junho das suas vidas, com uma obrigação involuntária e desoladora.
As datas têm este poder de nos aprisionar, como se significassem etapas concretas em que tudo começou, em que tudo terminou, mas não é bem assim, pois entre o nascimento e a morte houve todos os dias em que amaste, sorriste, viajaste, tocaste o coração de alguém.
Houve aquele dia sem data marcada em que te apaixonaste pela primeira vez, houve um outro dia não assinalado no calendário, em que te tornaste mulher, outro houve em que escutaste um grupo qualquer e dançaste e cantaste, até tudo o resto desaparecer em teu redor. Imagino, quer dizer, tenho a certeza de que tiveste uma imensidão de dias sem data assinalada, que te marcaram no mundo.
Houve as conquistas intelectuais, houve as conquistas pessoais, houve as batalhas travadas e vencidas, outras travadas e perdidas, mas houve, houve, houve. Houve vida entre a data de princípio e de fim.
Houve um meio inteiro das datas que te significam. Um mundo inteiro que me faz crer que viveste. Muito aquém do que poderias ter vivido, mas imensamente além de tantos outros, cuja vida se limitou a uma eternidade de anos sem conquistas.
Por tudo isto tentarei celebrar-te sempre todos os dias, sem princípio, nem fim, pois agora já não te reges pelos nossos calendários rotineiros. Agora és maior do que tudo aquilo que nos contabiliza em meses e anos e dias.
Agora és muito mais do que os trinta 6 de Junho que passaste, agora és plena, inigualável, total e, com alguma sorte, nada lembras já de nós, nem dos que te choram numa saudade infinita. Agora és como sempre imaginei que fosses: Imensa.

8 comentários:

macaca grava-por-cima disse...

e agora estoua chorar na caixa do Continente...

Melissa disse...

God damn, Casaca.

Morro de saudades da Rita, e tive-a por tão poucochinho tempo. Hoje o meu coração está com ela e com todos que cá ficaram a amá-la.

Devíamos vir mais bem equipados para isto da morte.

Catarina disse...

Que texto maravilhoso, Ana!
Tenho a certeza de que a Rita a esta hora está "lamechas". Beijinhos grandes

gralha disse...

Faz falta o sol, hoje, para acompanhar a doçura das tuas palavras, Ana.

Ana C. disse...

Querida macaca, eu também choro muitas vezes na caixa do Continente, mas é quando vejo a conta :) (não ligues, que eu tenho o hábito parvo de dizer piadas nos momentos mais inoportunos. Rir para não chorar)
Melissa, o nosso coração encheu-se bastante à conta da Rita. Encheu-se tanto que o ar nunca se há de perder.
Catarina, adoro puxar o lado lamechas da Rita. Sou doutorada nisso :) Beijinhos para ti.

Luisa Bernardes disse...

Rita com 3 ou 4 anos:
-Mamã, a que horas nasci?
-Às três da manhã...
-E...estavas a dormir, mamã???
-Eh, eh, claro, e quando acordei estavas ali ao meu lado...
(E sempre te tive ao meu lado daí em diante.)

Obrigada Ana, este é a minha partilha da Rita convosco, suas amigas! <3

Naná disse...

No fundo todos nós recordamos todos os dias, carregamos a saudade em nós todos os dias... mas nestes dias... a dor aumenta, por isso, sentimos mais a sua falta.
Mas ela está contigo todos os dias, no teu pensamento, em tudo o que fazes!

Vânia Silva disse...

Não sei quem era a Rita, mas os meus olhos quase responderam ao nome, com tanta verdade nas tuas palavras.
Sabes que acredito que a saudade é vantajosa, liga-nos ao mundo e ao que já fomos ou já aconteceu.
É um lugar dentro de nós, onde guardamos as Ritas todas e onde vamos buscar tudo o que queremos.
Beijinhos,

http://saladosilenciocorderosa.blogspot.pt/