Há muitas mulheres que dizem que o facto de terem sido mães, não as modificou nem um bocadinho.
Eu não faço parte desse grupo de mulheres, pois, feliz, ou infelizmente, não sou impermeável às coisas que me sucedem.
E os filhos sucedem-nos, sim. Acontecem-nos. Inexoravelmente. Para sempre.
Não é suposto amarmos assim. Não é suposto o nosso coração bater para insuflar vida para além da nossa, mas ele passa a bater por eles, porque a vida deles acontece na nossa e assim será até ao fim.
Enquanto o nosso coração bater, eles estarão vivos.
Por isso, não é suposto que deixem de viver antes de nós, porque nos descompassam o coração, porque ele baterá sempre as vezes necessárias para nós e para eles, só que eles já não estão mais aqui e o coração cansa-se. Cansa-se, porque bate por muitas vidas, cego, obediente, instintivo, mas não os respira mais, não os sente, não ouve a sua voz, o som dos seus passos e passa a bater desesperado e sem recompensa.
A imagem daquele amor que nasce pequenino e cresce ao longo de uma vida inteira e que é só nosso, não o larga.
A imagem do colo, do filho menino, da mão, do quente do seu corpo, dos sussurros, do sono, das conquistas, do filho crescido, dos amores, dos sonhos não morre nunca dentro da mãe que lhe sobrevive.
Desde que fui mãe, quando oiço falar de um filho que partiu antes do seu tempo, penso na sua mãe e choro com ela.
17 comentários:
É mesmo isto.
Adorei este texto...
Já antes o disse aqui... a tua forma de escrever é absolutamente divinal, pelo menos para mim.. que a sinto a entrar-me nas veias!
Este texto traduz exactamente o que sinto desde que fui Mãe..
Peço-te autorização para o roubar...para o meu bloque, e para o qual vou enviar-te um convite...
Ana C., tu falas da maternidade de uma maneira que me toca, porque tornas em palavras aquilo que eu não consigo verbalizar sobre este assunto...
Quando soube da morte do Miguel Portas, a primeira coisa que me ocorreu foi isto mesmo, a dor que a HSC deveria estar a sentir...
Porque a admiro muito, assim como admirava o Miguel Portas.
Devia ser proibido a qualquer mãe sentir esta dor!
Pela minha história, penso, por ordem, nos filhos jovens, e dá-me um aperto. E depois, nos pais, e dá-me outro.
Quando soube, lembrei-me logo da HSC e dos filhos dele, foi inevitável. E depois pensei naquilo que a Melissa já postou: é incrível a qualidade de algumas pessoas, que superam todo o tipo de clubismos e ideologias. Essas pessoas são mesmo especiais, e o Miguel Portas era uma delas.
também eu
Tenho-me lembrado tanto dela como me lembro de outras que passam pelo maior de todos os desgostos. Queres crer que me têm vindo
à lembrança a forma como ela se ri, o tamanho das suas gargalhadas. Como ficará uma mãe depois de passar por aquilo que ela passou.Lembro-me da agora Ministra da Justiça, acho que não é mais a mesma pessoa. Não sei, pelo menos eu acho.
A minha bisavó perdeu a filha, mãe do meu pai, no dia em que esta completaria 33 anos anos. Tanta coisa que a vida lhe levou depois disso e ela nunca verteu uma lágrima. Dizia sempre que as tinha gastado todas quando a filha morreu.
Os meus avós maternos também perderam um filho muito novo, também aos 33 anos. O meu avô nunca se refez, morreu pouco tempo depois. A minha avó materna tampouco chorou quando morreu o meu avô.
É cliché, mas um filho passar antes dos pais é a natureza virada ao contrário, e não sabemos andar com as mãos - a nossa capacidade de adaptação não chega para tanto. É preciso muito ajuste para uma porrada assim.
A ministra da justiça não é a mesma, não senhora. Concordo em absoluto Mariinha. Continua sagaz, inteligente e boa profissional, mas alguma coisa quebrou dentro dela e isso vê-se...
saudosa, depois das tuas palavras, leva tudo o que quiseres. Leva o blogue inteiro :)
Este texto está tão bem escrito, tão lindo... obrigada!
É mesmo assim...passamos a viver com o coração fora do peito. Não devia ser possível um filho partir antes da mãe :-(
Muito obrigada pelo seu conforto. Tentarei continuar a sorrir porque isso era o que o Miguel gostaria que eu fizesse.
E amanhã recomeçarei a trabalhar!
Se vier a ler isto: bom recomeço, Helena!
Este texto exprime tudo aquilo que nos passa cá por dentro enquanto mães. Nem todas o conseguimos passar cá para fora assim...
que texto tão bonito, lembrou-me a célebre definição do Hank (Californication) sobre o que é ter um filho: "my heart was somehow beating outside my chest, exposed to the elements."
E para mim que sou fã desta mãe, para mim que tenho uma profunda admiração por ela ainda dói mais, agora que também sou mãe!
Um beijo enorme Helena, daquela que a adora ouvir rir e que lê o que escreve com tanta paixão como o escreveu!
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