Abraça a filha doente, numa fotografia com contornos de amor e dizem-lhe que acredite na cura, que os milagres existem. Ela, que acreditou durante tanto tempo que os milagres aconteciam, começa a ficar cansada de ouvir falar em milagres. Apenas quer sentir o cheiro da sua menina.
Abraça a filha doente, numa fotografia a preto e branco, onde deixa o seu desejo de poder trocar de lugar com ela, pois essa troca de vidas é a única ideia que se lhe afigura como razoável, e falam-lhe de novo na fé que não pode perder. Ela, mulher de fé durante tantos anos, começa a ficar cansada que lhe falem de fé. E acha que pode perdê-la sim, sem que seja crime, sem que tenha que sentir-se pecadora.
Ela, mãe de uma menina doente, olha a fotografia a preto e branco e nada concebe além daquele momento. Deseja apenas ficar ali, sentindo a respiração quente da sua filha doente.
A mãe não quer mais ouvir falar de fé, nem de milagres. Ela não quer mais saber de curas metafísicas, nem correntes de orações que salvarão o seu amor.
Ela quer que calem as palavras de consolo, as correntes de fé, as orações pela cura que não cura nunca.
Ela não quer escutar rigorosamente mais nada além das batidas do coração da menina que é sua, por enquanto. Ela quer apenas poder trocar de lugar. Esse é agora o único milagre que pede.
Grandes diálogos: O Apartamento
Há 3 semanas
7 comentários:
Ai Ana... que nó na garganta... nem consigo exprimir o que sinto ao ler este texto... fico sem conseguir respirar...
Querida macaca, também eu fico doente, aliás, tenho andado doente, mas de olhar à minha volta e ver a quantidade de pessoas que sofrem à conta do cancro, quer na própria pele, quer na pele daqueles que amam. É definitivamente a praga do milénio...
Ainda hoje recordo o rosto dum menino de 3 anos, que vi no IPO em Lisboa, numa das vezes que acompanhei a minha mãe aos tratamentos...
Recordo o rosto dele e principalmente os olhos sem brilho... e se sei o quanto é dificil perder um pai ou uma mãe para esta maldita doença, não quero nunca vir a saber o que é ter um filho nas garras do cancro. Mil vezes tomaria o seu lugar!
É de uma grande coragem e humanidade colocares-te na posição de alguém que passa por isso, que deve ser das coisas mais horríveis e insuportáveis que um ser humano pode passar. Eu prefiro nem pensar que pode acontecer a qualquer mãe, que pode acontecer-me. E rezo pela força daquelas que estão mesmo a viver este pesadelo.
Que texto lindo. deixou-me de lagrimas nos olhos e coracao bem apertado.
:( que aflição. Não há palavras que aligeirem estes dramas. Espero o melhor
Bolas... é mesmo isso que escreve: maldita doença. Está a matar demais!
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