Não houve baixas por motivos de doença dos filhos no teu trabalho e houve doenças para dar e vender. Aliás, peco por falta de memória, houve uma baixa, sim, nos poucos meses em que aceitei um trabalho, e gerou confusão.
Não houve stress pela hora tardia a que chegavas a casa, pois a mãe tratava de ir buscar a filha mais velha à escola, muitas vezes com o filho mais novo adoentado e pendurado na anca, debaixo de chuva. A mãe ainda o faz.
Nunca tiveste que dizer que não a um compromisso de trabalho em detrimento de compromissos familiares.
Nunca levaste para o trabalho a preocupação de deixares um filho com febre na escola.
Nunca houve um centro de saúde congestionado por nós, pois não era preciso um papelinho para o trabalho. Um sagrado e difícil papelinho que justificasse a ausência em prol dos filhos.
Nunca houve a sobrecarga orçamental de um berçário, ou de uma creche, nem para nós, nem para o Estado.
Nunca houve uma carência que não pudesse ser satisfeita, um mimo que tivesse que ser adiado por outras obrigações mais importantes.
Não houve um tpc em que a nossa filha mais velha não pudesse usufruir do auxílio da mãe.
Várias foram, e são, as vezes em que as tarefas corriqueiras de dar banhos e lavar cabelos estavam cumpridas quando chegavas a casa mais tarde.
Sobrava espaço para uma história antes de dormir, para levantar-me antes de todos, todos os dias, a fim de preparar os pequenos-almoços e para verificar se ela estava bem agasalhada antes de sair, enquanto limpava o ranho do filho mais novo.
Umas vezes fi-lo com uma sensação da mais completa felicidade por poder fazê-lo, outras tantas vezes com o desespero de que ninguém via nada de tudo o que fazia todos os dias e de que queria mais alguma coisa. Tal e qual como num trabalho normal, mas sem a parte do ordenado, nem do subsídio de férias. Aliás, até sem o abono de família que desapareceu do mapa.
O meu trabalho diário é tal e qual como um trabalho normal, mas com a característica acrescida do amor e da ausência de folgas e férias.
Por isso, quando chegar o dia em que se celebram as mães, quando chegar a merda do dia em que se oferecem prendinhas e merdinhas, perde a cabeça e diz-me que sou a melhor mãe do mundo, enquanto me preparas o pequeno-almoço.
Posso até estar longe de ser a melhor mãe do mundo (só Deus sabe como padeço de histerismos e faltas de paciência e como sou a maior chata à face da terra, sim), mas sou a mãe que torna a tua existência mais suave. E é isto. Hoje, 10 dias depois dessa merda desse dia em que se celebra o trabalho mais nobre do mundo do amor, deixo aqui este manifesto a todos os maridos de mães a tempo inteiro.
Não nos fodam (sem ser no sentido literal).
*Não serve o presente texto para insinuar que não tenho alguém excelente a dividir a tarefa da criação comigo, serve apenas como auxiliar de memória futura a todos os maridos de mães a tempo inteiro.
Maioridade
Há 5 dias
16 comentários:
Muito bom!
Sim, é verdade. MAs e quando (quase) tudo isso acontece também com a mãe-trabalhadora-fora-de-casa.
é do caraças...
A mãe-trabalhadora-fora-de-casa é uma heroína, só superada pela mãe solteira, trabalhadora, ou não.
Mas a mãe que trabalha não deve aliviar a carga do pai e prejudicar-se a si própria. Apesar de ainda haver quilómetros de caminho de igualdade de deveres por trilhar, há que começar a trilhá-lo e se há altura em que se justifica a verdadeira divisão de tarefas, é quando os dois pais trabalham.
Acho que ser mãe a tempo inteiro é mais difícil do que ser mãe que (também) trabalha.
É que a mãe que está em casa não tem folgas, não sai de casa, não areja, e fala com menos adultos. E isto tudo pesa...
Não te serve de consolo, mas também eu padeço de histerismos, falta de paciência e por vezes sou muita chata!
Genericamente é verdade...mas há profissões e profissões e quando um ganha o dobro se houver alguém a "prejudicar" quem é? E depois há ainda a questão dos horários em que um trabalha das 9 às 18 e o outro quando calha. E um está sempre cá e o outro é rara a semana que não viaja para fora. E então tudo o que pode parecer partilhável, e que até é quando é possível, torna-se muito mais dificil. E sim, sobra muito mais para um do que para outro. Enfim...este assunto dava pano para mangas.
Ou seja, neste caso não é a mãe que abdica porque é mãe, mas sim porque é assim que faz sentido que seja.
Mas sim, também merecia um super "presente" de Dia da Mãe.
e aqui muita atenção que não estou a desmerecer de forma alguma o trabalho das mães a tempo inteiro...mas é que também me sinto uma, com a diferença que também trabalho fora de casa.
Vim cá parar por um link no FB e eis o que me fez lembrar (entre outros, que eu bato muito na mesma tecla):
http://5ausac.blogspot.pt/2009/07/o-caralho.html
Beijo e solidariedade.
Quero este texto partilhado por todo o mundo
O meu marido de mãe a tempo inteiro é um excelente pai, mas para uma mãe manter a sanidade mental é fundamental sentir-se valorizada, nem que seja na merda do dia da mãe. É isto e não custa assim tanto, posso garantir que é muito mais indolor do que o caminho da invisibilidade ;)
As mães devem ser largamente paparicadas no dia da mãe, largamente. Eu começo a anunciar esta minha premissa dias antes e, mesmo assim, nunca fui "largamente" paparicada. Fui assim-assim.
Se o meu marido ficasse em casa com o meu filho o dia inteiro, todos os dias, ia beijar o chão que ele pisava. Largamente. É que já passei uns tantos e não é pera doce.
Eu nunca poderia ser mãe a tempo inteiro porque:
- Engordo imenso quando estou em casa;
- Estou sempre a adiar fazer coisas porque há tempo (e depois fica tudo por fazer);
- Férias e mesmo só o fim-de-semana com eles e a casa e a comida e tudo... cansam-se. Ao domingo à tarde o R. fica com sunday blues e eu começo a sorrir porque vêm aí 5 dias de folga.
Na possível falta de pequeno almoço e falta de enaltecimento da minha condição de mãe/lady na mesa/louca na cama, escolhi uma t-shirt para o R. pagar que tem uma coroa, diz MOM e tem 3 corações vermelhos. Linda. Vesti-a no Dia da Mãe e sempre que a tenho lavada e passadinha a ferro. Sinto-me reconhecida quando a visto e fica-me lindamente!
Em partes do teu texto (muitas) vi-me como se me tivesse transformado numa personagem de um livro teu... assustador e reconfortante ao mesmo tempo, acreditas nisto? Tem lógica isto que digo?.... Quis a vida que viesse para longe do meu ponto seguro, Portugal, onde tenho todos os meus pilares, e metesse a minha profissão em "banho maria"! Muitos e muitas acharam "que sorte a minha! Aproveita para descansares e aproveitares cada segundo a tua filha!! Quem me dera!!"... Descansar? Viver todos os dias feliz ao ver a minha filha (2 anos) sem stress nenhum? Viver dias sem me irritar ou sem histerismo?.... Num filme certamente! Pois aqui na vida real é mesmo com escreveste... Dá tanto trabalho manter e assegurar o equilíbrio familiar!!! Felizmente tenho alguém ao meu lado que faz questão de me valorizar frequentemente, mas há dias em que sentimos que a nossa mente vai fugir para a loucura certo?;) É das profissões que mais trabalho dão, mas a menos valorizada... Mãe a tempo inteiro! (estou quase a terminar o livro ;) )
Também eu, à semelhança da Luísa livros, deixei uma vida de mãe trabalhadora das 10h às 19h, com familiares e amigos envolvidos nesta caminhada que é educar um filho, para me dedicar agora exlusivamente à maternidade.
E se até aqui achava uma tarefa árdua, hoje em dia acho-a hérculea, revejo-me imenso no seu texto, é difícil manter a "cabeça à tona" de alguma normalidade ao fim de meses a fio sem um amparo de ninguém e sem o merecido reconhecimento.
Ah! E também não fui mimada no dia da Mãe, digamos que "adquiri" uns mimos para mim, sem culpa, porque eu mereço ;)
Tenho tanta admiração pelas mães e pais a tempo inteiro que não consigo imaginar o reconhecimento digno dessa dedicação a 100%. Felizmente, há pais e mães trabalhadores que o sabem fazer melhor que eu :)
Pois eu tenho a reconhecer o meu companheiro por ele ficar com o nosso filho quando ele está doente, mesmo que tenha feito um turno que acabou às 4h ou 5h da manhã!
Sou eu que me sinto mal de vir trabalhar e raramente ficar com o nosso menino, quando está doente... porque simplesmente não compensa financeiramente... é horrível reconhecer isto, mas é verdade! Vou para o trabalho com o coração mirrado, certa de que deveria ter ficado em casa a limpar ranho e tirar temperaturas e administrar xaropes...
Pela parte que me toca (o meu tempo inteiro ainda está sedeado em casa, mas as filhas já passam os seus dias nas escolas há uns aninhos), eu nunca quis ser especialmente apaparicada no dia da mãe....eu gostava de ter sido mais vezes mimada, tipo, todos os sábados de manhã, vá! ;)
Gostei muito de ler.
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